Maria José Almeida do Nascimento
almeidamariajose@bol.com.br
Resumo
Este artigo
discorre sobre desafios que o cristão enfrenta na era pós-moderna.Atualmente o
desenvolvimento das instituições sociais assumem parâmetros nunca vistos. A
tecnologiatransforma constantemente a vida de pessoas em todo o mundo. Os seus
benefícios são diversos. Mas também não podemos deixar de perceber o lado
sombrio que rodeia o avanço tecnológico. Particularmente no contexto virtual,
onde tempo e espaço nem sempre coincidem, o cristão se depara com debates
específicos da pós-modernidade. Nesse tempo ondesuperficialidade e pressa
permeiam as relações, a flexibilidade impera e princípios absolutos são cada
vez mais relativizados, o cristão é cercado por situações que exigem que ele
assuma uma postura combativa a fim de preservar seus valores e ser o sal da
terra.Numa era de coisas surpreendentes e cada vez mais efêmeras, o cristão
precisa se fortalecer na Palavra de Deus e seguir declarando que todas as
coisas passam menos o que vem do Nosso Senhor.
Palavras-chaves:pós-modernidade,
cristão, desafio, fé, virtual.
1.
Introdução
Estudiosos discutem o que faz os dias atuais serem chamados de
pós-modernos. Conflitos eclodem em vários pontos do mundo num fenômeno
contemporâneo que abala as estruturas estabelecidas. Conceitos são descartados
e outros são rapidamente assumidos, na expectativa de também em pouco tempo
serem considerados obsoletos; tabus são quebrados; a moralidade é questionada; e
o pragmatismo domina. Estamos numa terra populosa que ergue a bandeira do
individualismo.Vivemos num mundo globalizado no qual a fome ceifa diariamente
milhares de vidas e o consumismo apresenta-se como um estilo de vida. Tempos assombrosos
e até mesmo de barbárie social, onde somos constantemente confrontados em nossa
fé. Mas afinal como podemos nos referir a este tempo?
Estudiosos da Sociologia fazem referência a termos como modernidade e
pós-modernidade. O primeiro a tornar popular o termo pós-modernidade foi
Jean-François Lyotard. Esse autor concebe a pós-modernidade como um
deslocamento das tentativas de fundamentar a epistemologia e da fé no progresso
planejado humanamente. Nesse caso a condição da pós-modernidade é caracterizada
pela evaporação do enredo dominante através do qual somos inseridos na história
como seres com um passado definitivo e um futuro previsível (GIDDENS, 1991).
Contudo ao falarmos de pós-modernidade é essencial elucidar o termo
modernidade. Para Giddens (1991)o termo modernidade se refere ao estilo e a organização
social que surgiram na Europa a partir do século XVII e que se tornaram mais ou
menos mundiais em sua influência. Atualmente, ainda conforme esse autor,
argumenta-se que estamos no limiar de uma nova era, além da própria
modernidade. Uma variedade de termos tem sido usada para se aludir a essa
transição, tal como sociedade de informação ou sociedade de consumo. Contudo a
maioria das discussões põe em pauta termos ligados a um estado de coisas
precedentes, que estão chegando a um encerramento. Daí falar-se em
pós-modernidade e sociedade pós-industrial. Alguns dos debates sobre esse tema
se concentram sobre transformações institucionais, especialmente as que sugerem
que estamos nos deslocando de um sistema baseado na manufatura de bens
materiais para outro relacionado mais com informação.
Para tentarmos compreender esse momento, ainda de acordo com Giddens
(1991), é necessário olhar para a própria modernidade. O desenvolvimento das
instituições sociais modernas e sua difusão em escala mundial criaram
oportunidades bem maiores para os seres humanos usufruírem de uma existência
segura que qualquer tipo de sistema pré-moderno. Mas a modernidade tem também
um lado sombrio. Para dois dos três fundadores clássicos da Sociologia, Marx e
Durkheim, a modernidade é turbulenta. No entanto, ambos acreditavam que as
possibilidades benéficas abertas pela era moderna superavam suas
características negativas. O terceiro fundador da Sociologia, Max Weber, era o
mais pessimista dos três. Ele via o mundo moderno como um mundo paradoxal no
qual o progresso material era obtido apenas pela expansão da burocracia que
esmagava a criatividade e a autonomia individual. Contudo, nem mesmo ele
antecipou a extensão do lado sombrio da modernidade.
Os três sociólogos não chegaram a prever o poder destrutivo em larga
escala do meio ambiente material. O lado arbitrário do poder político também
não foi considerado. O despotismo parecia algo dos estados pré-modernos. O
fascismo, o holocausto e o stalinismo evidenciaram que a possibilidade de
totalitarismos é contida dentro dos parâmetros da modernidade ao invés de ser
por eles excluída. Ameaças de confronto nuclear entre nações é uma realidadeque
os pensadores sociais escrevendo no final do século XIX e início do século XX
não anteciparam. O mundo em que vivemos hoje é perigoso.Nesse sentido é preciso
considerar que estamos alcançando um período em que as consequências da
modernidade estão se tornando mais radicalizadas e universalizadas do que
antes.Trata-se da era pós-moderna (GIDDENS, 1991).
É no contexto pós-moderno, na perspectiva da separação entre o tempo e o
espaço destacada por Giddens (1991), que discutiremos os desafios que o cristão
enfrenta em sua jornada como cidadão do céu que peregrina nesse mundo.
2.
Os desafios do cristão na perspectiva da
separação entre o tempo e o espaço
De acordo com Giddens (1991) nas sociedades pré-modernas espaço e tempo
coincidem amplamente na medida em que as dimensões espaciais da vida social
para a maioria da população são dominadas por atividades localizadas. É a
modernidade, por sua vez, que arranca o espaço do tempo, gerando relações entre
outros não presentes, localmente distantes. Nessas condições é crescente o fato
de que os locais são completamente penetrados e moldados em termos de
influências sociais bem distantes deles. O que estrutura o local não é
simplesmente o que está presente na cena; a forma visível do local oculta
relações que determinam sua natureza. É nessecontexto pós-moderno que está
inserido o cristão de hoje.
Nesse sentido refletimos sobre o uso do recurso virtual sob duas formas.
Primeiro aludimos ao uso do mesmo para leituras de material para estudo ou
entretenimento. A facilidade com que atualmente nos deparamos com informações
diversas é assombrosa. Não precisamos viajar até à Grécia para vê seus
monumentos que atravessaram os séculos. Igualmente podemos estudar a história
do Cristianismo, com ênfase na arqueologia bíblica, por exemplo, de forma
cômoda, no conforto de nossa casa. Contudo a mesma tecnologia que nos favorece
pode também nos embaraçar. Trata-se de uma faca de dois gumes. Basta um clique
e podemos permitir que algo se coloque entre nós e Deus.
Nesse caso o cristão precisa, à semelhança de outras circunstâncias,
discernir aquilo que o edifica. O servo de Deus precisa dizer para si mesmo, como
escreveu o apóstolo Paulo, que “todas as coisas me são lícitas, mas nem todas
as coisas convêm; todas as coisas me são lícitas, mas nem todas as coisas
edificam” (1 Co 10:23).
O que temos visto e ouvido na solidão do mundo virtual? Podemos falar em
público sobre isso e recomendar a outros com a certeza que continuamos a salgar
o mundo pós-moderno? Ou temos permitido “raposinhas”, ervas daninhas em nossa
lavoura, relativizando o que é absoluto? Não podemos deixar de entender que
muitas vezes os grandes acidentes têm origem nas estradas retas, quando nosso
excesso de confiança nos faz imprudentes na direção de um carro.Assim também
pode ocorrer com nossa vida. Todo o tempo é necessário estar alerta, evitando
tudo que manche nosso relacionamento com Deus. Precisamos ser vigilantes e
rejeitar o que compromete nossa santidade. Nossa escolha deve ser aquela que
agrade a Cristo.
O novo homem, transformado pelo chamado de Cristo, já não pode viver mais
em conformidade com as coisas do mundo. A cada dia ele deve reafirmar sua
condição de servo de Senhor.Nossos pensamentos, palavras e atitudes devem
exalar o perfume do Nosso Redentor. A nossa essência é mudada. Tudo é visto
numa nova perspectiva. Como destaca Piper (2009), no novo nascimento Deus
remove o coração de pedra e o substitui por um coração de carne, que nesse caso
tem o sentido de vivo, terno, sensível. No novo nascimento somos capacitados a
enxergar a majestade de Jesus.
Para o cristão as coisas temporais não podem assumir a relevância das
coisas eternas. Caminhamos rumo a nossa verdadeira morada e precisamos viver de
acordo com nossa nova identidade.
Nesse sentido Lloyd-Jones (2009) ressalta que a compreensãodo real
significado do que ocorreu quando Jesus Cristo morreu na cruz faz tudo o mais
perder sua importância.A cruz é a revelação do caráter de Deus. Ela exibe os
atributos divinos: a sabedoria eterna de Deus, Seu plano para este mundo, a Sua
justiça, retidão e santidade.
Ser santo é, portanto, uma condição indispensável para o nascido de novo.
A santidade é o alvo de nossa redenção. Da mesma forma que Jesus morreu para
que fôssemos justificados, também somos justificados para sermos santificados.
Nós nascemos de novo para que possamos crescer à semelhança de Nosso Redentor
Jesus Cristo (PACKER, 2002).
Mesmo diante do milagre de um novo coração dado pelo Senhora todo
instante somos desafiados e combatidos pela nossa própria natureza e pelo mundo
em nossa obediência a Deus. A busca de santidade deve, portanto, ser a meta do
cristão em qualquer era. E essa busca deve ser o resultado de uma intimidade
com Deus, que é conseguida na meditação de Sua Palavra e na oração. Lloyd-Jones
(2009) destaca que existe duas autoridades supremas, a Bíblia ou qualquer outra
coisa que nos agradar. Ou seja, de um lado a Bíblia, absoluta; do outro todas
as demais coisas, mutáveis. Para o cristão é preciso sempre saber em primeiro
lugar o que diz a Palavra de Deus. Sermos guiados pelo Senhor num mundo ao qual
não pertencemos. Essa questão fará a diferença em nossas escolhas ao nos
depararmos com as ofertas do mundo virtual.
O segundo uso virtual que pretendemos discutir diz respeito aos
relacionamentos e contatos desenvolvidos por meio desse recurso. Até que ponto
nós estamos investindo em relacionamentos saudáveis e usando a tecnologia a
nosso favor para esse fim é a questão. A tecnologia se apresenta à primeira
vista como um recurso positivo dos tempos pós-modernos. É necessário, então,
levarmos em conta quando uma conversa ou contato virtual é a opção, e quando
simplesmente nos acomodamos a “segurança” de uma tela (que cada vez mais é
aprimorada e se torna mais eficaz) e deixamos em segundo plano a possibilidade
de um caloroso olhar, aperto de mão ou um abraço. Enfim, de fato desenvolvermos
relacionamentos. Para que enfrentar um trânsito complicado, gastar horas num
longo percurso, se eu posso “conversar” sem sair de casa? Essa pode ser uma
interrogação que se coloca como uma das mais simples para o cristão na era
pós-moderna. Porém, ao mesmo tempo expressa como decidimos cuidar e amar nossos
irmãos.Assim é algo que deve ser refletido e reavaliado. É claro que não
podemos esquecer a importância de uma comunicação com um missionário, por
exemplo, que se encontra em outro país, a milhares de quilômetros e com o qual
não seria tão fácil estarmos presentes. Mas é fundamental sorrirmos e chorarmos
sem aintervenção da “eficaz” ferramenta tecnológica. Precisamos sair da “zona
de conforto” e andarmos lado a lado como povo de Deus.Sermos misericordiosos e
exalarmos o perfume de Cristo com nossa presença física.Assim criamos
possibilidades para relações afetivas saudáveis, pautadas pela máxima ensinada
pelo Senhor Jesus Cristo, a de amarmos ao próximo como a nós mesmos.
Outro aspecto nesses contatos virtuais é a extensão de nossa influência.
Estamos influenciando ou temos cedido em nossas convicções? Temos declarado
quem de fato somos ou nos “escondemos” no criativo mundo virtual para sermos
aceitos numa “tribo”? Entendemos que o desafio reside realmente na obediência à
Palavra do Senhor e na centralidade que damos a Cristo em nossas vidas.
Ao questionarmos os desafios que o cristão enfrenta neste mundo, com
todas as suas transformações e peculiaridades, é fundamental nos direcionarmos
para aquilo que faz com que esse cristão esteja neste mundo sem, contudo, ser
deste mundo. Estamos falando do chamado do Senhor Jesus Cristo. O sim ao
chamado do Senhor Jesus para ser seu discípulo coloca o homem em separado. Como
bem destaca Bonhoeffer (2004), cada um é chamado individualmente e tem que ser
discípulo sozinho. O ser humano chamado não pode esconder-se por detrás de pai,
mãe, povo ou história. Cristo quer que nada se interponha entre Ele e seu
discípulo. E seguir a Jesus implica viver na perspectiva do reino dos céus. Ao
mesmo tempo os discípulos são orientados para a sua missão terrena. Jesus
declara que seremos o sal da terra.Contudo, Ele alerta sobre os riscos de nos
tornarmos insípidos e não fazermos diferença no mundo. São Seus ensinamentos
que devem nos nortear enquanto peregrinamos para salgar o mundo. Nossas
escolhas e atitudes não podem ser fruto de uma época, de um mundo pós-moderno e
fugaz que ignora a soberania de Deus. Mesmo que enfrentemos constantemente lutas
em nossa condição como discípulos de Cristo, não combatemos com armas humanas e
em nossa própria força. Manning (2010) enfatiza que o Espírito Santo de Deus
nos ilumina com sabedoria e nos capacita para escolhermos ser um com Cristo em
todos os lugares e circunstâncias. Como aprendemos na Palavra de Deus, em
Efésios capítulo 6, precisamos nos fortalecer no Senhor. Nossa orientação vem
diretamente do Glorioso Pai quando submissos escutamos a Sua voz e nos curvamos
perante Seu senhorio.Nesse sentido precisamos perseverar nas Escrituras e
humildemente fazermos da oração uma prática diária.
3.
Considerações Finais
Vivemos tempos velozes, de desencontros, de desconfianças. Tempos de caos,
confusão e relativismo. Como nos comportarmos frente a situações que sutilmente
se agigantam e testemunharmos nossa obediência e amor a Deus é uma constante na
vida do cristão. Em meio a tantas discussões e direções é preciso enxergar que
só existe um caminho. É essencial priorizarnosso relacionamento com Deus. Após
o despertamento que o Espírito operou em nós para a fé e a vida eterna é
fundamental que sigamos a Cristo fielmente, dizendo sim para aquilo que Ele
aprova e gritando não para tudo que O aborrece.
Precisamos administrar o tempo com sabedoria, escutando a voz de Deus e meditando
na Sua Palavra para não sermos confundidos.Precisamos celebrar alegremente a
majestade de Deus e declarar a Sua soberania. Se espaço e tempo já nem sempre
coincidem, como na época de Paulo e de Barnabé, e de tantos outros discípulos
de Cristo, precisamos a exemplos desses, discernir as coisas eternas das
temporais. Continuemos a “combater o bom combate...” (2 Tim 4:7) até finalmente
estarmos face a face com Nosso Senhor. Prossigamos declarando ao mundo quem é
Deus e salgando este mundo.
Referências Bibliográficas
ALMEIDA, J. F (trad.). A Bíblia Sagrada. São Paulo: Vida,
1997.
BONHOEFFER, Dietrich. Discipulado. São Leopoldo: Sinodal,
2004.
GIDDENS, Anthony. As consequências da modernidade. São Paulo:
Editora da Universidade Paulista, 1991.
LLOYD-JONES, Martyn. A mensagem da cruz. Brasília: Editora
Palavra, 2009.
MANNING, Brennan. A implacável ternura de Jesus. São
Paulo: Naós, 2010.
PACKER, J. I. A Redescoberta da Santidade. São Paulo:
Editora Cultura Cristã, 2002.
PIPER, John. Finalmente Vivos. São Paulo: Editora Fiel, 2009.
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